quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Os Impostos Não Deixarão os Ricos Menos Ricos, Mas Podem Deixar os Pobres Menos Pobres

Publicado em por justicafiscal

*Dão Real Pereira dos Santos

O mundo inteiro acompanhou com surpresa a declaração do milionário norteamericano Warren Buffet, seguida de manifestação de outros 45 milionários daquele País, pedindo ao presidente Barack Obama que lhes sejam cobrados impostos e que sejam revogados os benefícios fiscais que vêm privilegiando os ricos há bastante tempo. A instabilidade produzida pelo enorme e crescente fosso existente entre os mais ricos e o restante dos cidadãos parece ter sensibilizado as classes sociais historicamente beneficiadas por um sistema econômico e fiscal profundamente concentrador.

O pioneiro Warren Buffet, presidente da Berkshire Hathaway, declarou em sua petição, que enquanto a maior parte dos americanos luta para fazer frente às despesas e enquanto as classes baixas e médias lutam por eles no Afeganistão, os super-ricos continuam a ter isenções fiscais extraordinárias.


Seguindo a mesma linha outros 16 milionários franceses ofereceram-se também a pagar mais impostos, com o objetivo de contribuir para a resolução dos problemas financeiros do país. Dado o caráter extraordinário do agravamento da dívida do Estado que ameaça o futuro da França e da Europa e que levou o governo francês a pedir aos cidadãos um esforço de solidariedade, alguns super- ricos daquele país se sentiram na obrigação de também contribuir com o esforço nacional e se dispuseram a pagar um imposto excepcional sobre a riqueza.

Estas inusitadas e inesperadas manifestações de consciência social ou de preocupação com o fato de que o aprofundamento das desigualdades pode produzir desequilíbrios e tensões sociais, com efeitos talvez bem mais danosos economicamente do que pagar tributos, revelam a triste realidade de que os muito ricos do mundo encontram-se realmente imunes aos sistemas impositivos nacionais e só se submetem aos impostos se quiserem e quando pedirem. Se de fato é assim, que pelo menos os pedidos de alguns sirvam para sensibilizar os demais.

E os nossos milionários, onde estão? O que pensam? Em 2010, 63 mil milionários brasileiros detinham, só em aplicações financeiras, 371 bilhões de Reais, segundo dados divulgados pela Associação Brasileiras das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (ANBIMA). Um levantamento do Merrill Lynch Global Wealth Management e da Consultoria Cappemini, também de 2010, revela que o número de brasileiros com mais de 1 milhão de dólares no país, era de 155 mil pessoas, colocando o Brasil na 11ª posição em número de milionários. Paradoxalmente, encontramo-nos entre os 10 países com maior concentração de renda do planeta.


Revelando o enorme fosso social existente no país, segundo dados do IBGE, em 2009, 107 milhões de brasileiros (quase 60% da população) viviam com renda inferior a 465 Reais. Ainda que a desigualdade social venha sendo reduzida nos últimos anos, fruto do incremento de políticas de transferências de rendas para os setores mais empobrecidos, como o programa bolsa-família, por exemplo, os níveis de concentração de renda e riquezas no Brasil ainda é um verdadeiro escândalo social.


Enquanto a renda predominante dos milionários decorre principalemente de rendimentos de capital, seja na forma de lucros seja na forma de rendimentos de aplicações financeiras, a renda das classes menos privilegiadas decorrem fundamentalmente do trabalho. E todos sabem, embora poucos comentem, que o sistema tributário nacional trata de forma antiisonômica as rendas em função de sua origem, isentando do Imposto sobre a Renda, por exemplo, a distribuição de lucros aos sócios e acionistas das empresas, ou sujeitando à alíquotas mais brandas os rendimentos de aplicações financeiras.

A profunda regressividade do sistema tributário produz, pela cobrança de impostos, um distanciamento ainda maior entre ricos e pobres. Conforme o Relatório de Observação n° 2 – Indicadores de Iniquidade do Sistema Tributário Nacional, editado pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social – CDES, quem ganha até 2 salários mínimos compromete quase 50% do seu rendimento com tributos, enquanto aqueles que ganham mais de 30 salários mínimos não gastam mais do que 28%.

A chaga social da desigualdade, que se aprofunda em grande medida por um sistema tributário que promove a concentração de renda quando deveria promover a redistribuição, ao lado dos inúmeros benefícios fiscais concedidos às classes mais ricas impõe que, também aqui, haja uma tomada de consciência daqueles que historicamente se beneficiaram e acumularam verdadeiras fortunas.

Está mais do que na hora de os milionários do Brasil levantarem também a bandeira da justiça fiscal e pedirem ao Congresso Nacional para não serem esquecidos quando a conta da desigualdade e do desequilíbrio social vier a ser cobrada. Defender a implementação do Imposto sobre Grandes Fortunas, a revogação da isenção sobre a distribuição dos lucros, uma maior progressividade nos impostos sobre a renda e patrimônio, o tratamento isonômico das rendas, a federalização e implementação de um imposto sobre heranças progressivo e socialmente justo e a redução dos tributos sobre o consumo, é uma forma de os milionários participarem da construção de um Estado mais justo para todos, com menos desigualdades e com menos tensões sociais.

Sobretudo neste momento em que se buscam novas fontes para financiar a saúde pública e melhorar a qualidade de vida de milhões de pessoas, esta singela contribuição dos milionários brasileiros seria providencial e decisiva. Lancemos, portanto, uma grande campanha nacional para pedir que os ricos brasileiros assumam também sua condição de cidadania, e queiram pagar mais impostos como todos os demais somos obrigados. OS IMPOSTOS NÃO DEIXARÃO OS RICOS MENOS RICOS, MAS PODEM DEIXAR OS POBRES MENOS POBRES.
*Presidente do Instituto Justiça Fiscal

Nenhum comentário: