Disponibilizamos abaixo os vídeos com as palestras do Seminário sobre o Projeto de Lei 1992/2007, “Previdência Complementar: A quem
interessa?" realizado na Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, no dia 12/12/2011.
Sindicato Nacional dos Auditores - Fiscais da Receita Federal do Brasil
terça-feira, 31 de janeiro de 2012
sexta-feira, 27 de janeiro de 2012
O custo humano de um iPad
Por Charles Duhigg e David
Barboza, com a colaboração de Gu Huini
The New
The New
Publicado no UOL Notícias
Os trabalhadores montam iPhones, iPads e outros
aparelhos muitas vezes em péssimas condições.
A explosão cortou o prédio
A5, em uma noite de sexta-feira em maio, uma erupção de fogo e barulho que
contorceu os canos de metal como se fossem canudos descartados.
Quando os trabalhadores
que estavam no refeitório correram para fora, viram uma fumaça preta saindo das
janelas estilhaçadas. Vinha da área onde os operários poliam por dia milhares
de caixas metálicas que servem de corpo dos iPads.
Duas pessoas morreram
imediatamente, e mais de uma dúzia de outras ficaram feridas. Enquanto os
feridos eram levados em ambulâncias, um em particular se sobressaía. Ele tinha
perdido as feições com a explosão, arrancadas pelo calor e pela violência da
explosão que deixaram apenas uma mancha preta e vermelha no lugar da boca e do
nariz.
“Estou falando com o pai
de Li Xiaodong?”, perguntou uma pessoa ao telefone, na casa dos pais de Lai. Seis
meses antes, o rapaz de 22 anos tinha se mudado para Chengdu, no Sudeste da
China, para se tornar um dos milhões de engrenagens humanas que são a força do
maior, mais rápido e mais sofisticado sistema de manufatura da Terra.
“Ele está com problemas”,
disse a pessoa ao telefone ao pai de Lai. “Vá ao hospital o mais rápido
possível”.
Na última década, a Apple
se tornou uma das empresas mais poderosas e ricas do mundo, em parte por
dominar a produção mundial. A Apple e outras empresas de alta tecnologia -assim
como dezenas de outras indústrias americanas- atingiram um ritmo de inovação
quase inédito na história moderna.
Entretanto, os
trabalhadores montam iPhones, iPads e outros aparelhos muitas vezes em péssimas
condições, de acordo com funcionários que trabalham nessas fábricas, defensores
dos trabalhadores e documentos publicados pelas próximas empresas. Os problemas
são variados e vão desde ambientes de trabalho nocivos até sérios problemas de
segurança -algumas vezes fatais.
Os operários trabalham
horas em excesso, em alguns casos sete dias por semana, e moram em dormitórios
lotados. Alguns dizem que ficam tanto tempo em pé que suas pernas incham e mal
podem andar. Menores de idade ajudaram a montar os produtos da Apple, e os
fornecedores da empresa descartaram lixo tóxico de forma imprópria, além de
falsificarem os registros, de acordo com relatórios da empresa e grupos de
advocacia, que muitas vezes são considerados monitores independentes dentro da
China.
O mais preocupante,
segundo os grupos, é o desrespeito de alguns fornecedores à saúde dos
trabalhadores. Há dois anos, 137 funcionários de um fornecedor da Apple no
Leste da China foram feridos após receberem ordens de usar um agente químico
venenoso para limpar as telas dos iPhones. Em apenas sete meses do ano passado,
duas explosões em fábricas de iPads, inclusive em Chengdu, mataram quatro
pessoas e feriram 77. Antes das explosões, a Apple foi alertada que as
condições dentro da fábrica de Chengdu eram nocivas, de acordo com um grupo
chinês que publicou essa advertência.
“Se a Apple foi advertida
e não agiu, isso é repreensível. Mas há práticas moralmente repugnantes em um
país que são aceitas em outro, e as empresas tiram vantagem disso”, disse
Nicholas Ashford, ex-diretor do Comitê Nacional de Consultoria de Segurança
Ocupacional e Saúde, um grupo que assessora o Departamento de Trabalho dos EUA.
A Apple não é a única
empresa de eletrônicos que faz negócios com uma cadeia de fornecedores
preocupante. Más condições de trabalho foram documentadas em fábricas de
produtos da Dell, Hewlett-Packard, IBM, Lenovo, Motorola, Nokia, Sony, Toshiba
e outras.
Executivos atuais e
antigos da Apple dizem que a empresa fez avanços significativos no sentido de
melhorar as fábricas, nos últimos anos. A Apple tem um código de conduta do
fornecedor que detalha os padrões de trabalho, proteções de segurança e
inúmeros outros tópicos. A empresa montou uma campanha de auditoria vigorosa e,
toda vez que abusos são descobertos, correções são exigidas, diz a Apple.
Contudo, problemas
significativos persistem. Mais da metade dos fornecedores auditados pela Apple
violaram pelo menos um aspecto do código de conduta a cada ano desde 2007, de
acordo com os relatórios da Apple.
“A Apple nunca se
preocupou com nada além de que aumentar a qualidade do produto e diminuir o
custo de produção”, disse Li Minggi, que até abril trabalhava na gerência da
Foxconn Technology, uma das parceiras mais importantes de fabricação da Apple. Li,
que está processando a Foxconn por sua demissão, ajudou a administrar a fábrica
de Chengdu onde as explosões ocorreram.
A Apple recebeu resumos
extensos desta matéria, mas a empresa recusou-se a comentar. A reportagem se
baseia em entrevistas com mais de três dezenas de ex-empregados, inclusive meia
dúzia de executivos atuais ou antigos, com conhecimento de primeira mão do
grupo de responsabilidade de fornecedores da Apple, além de outros de dentro da
indústria de tecnologia.
Lai Xiaodong sabia que a
fábrica da Foxconn em Chengdu era especial. Dentro dela, os trabalhadores
estavam montando o mais recente e talvez o maior produto da Apple, o iPad.
Quando Lai conseguiu o
emprego para consertar máquinas da fábrica, uma das primeiras coisas que
observou foram as luzes excessivas, que quase o cegavam. Havia turnos 24 horas
por dia, e a fábrica estava sempre iluminada. A qualquer momento, havia
milhares de trabalhadores nas linhas de montagem ou sentados em cadeiras sem
encosto, agachados ao lado de grandes máquinas ou correndo entre baías de
carregamento. As pernas dos trabalhadores inchavam tanto que eles mancavam. “É
difícil ficar em pé o dia todo”, disse Zhao Sheng, funcionário.
Cartazes nas paredes
advertiam os 120.000 operários: “Trabalhe duro hoje ou trabalhe duro para
encontrar um emprego amanhã”. O código de conduta de fornecedores da Apple dita
que, exceto em circunstâncias extraordinárias, os funcionários não devem
trabalhar mais de 60 horas por semana. Mas na Foxconn, alguns trabalhavam mais,
de acordo com entrevistas, contracheques e pesquisas de grupos externos. Lai
logo estava trabalhando 12 horas por dia, seis dias por semana, de acordo com seus
contracheques. Os trabalhadores que chegavam atrasados tinham que escrever
cartas de confissão ou copiar citações. Havia “turnos contínuos”, quando os
funcionários tinham que trabalhar dois turnos sem parar, de acordo com
entrevistas.
O fato de Lai ser graduado
permitiu-lhe que ganhasse um salário de cerca de US$ 22 (em torno de R$ 40) por
dia, incluindo as horas extraordinárias -mais do que muitos outros. No final do
dia, ele se recolhia para um pequeno quarto, grande o suficiente para um
colchão, um armário e uma escrivaninha.
Essas acomodações eram
melhores do que muitos dos dormitórios da empresa, onde moram 70.000 operários.
Algumas vezes, 20 pessoas lotam um apartamento de três quartos, disseram os
funcionários. No ano passado, uma briga sobre contracheques gerou uma briga em
um dos dormitórios.
A Foxconn, em declaração,
negou as denúncias dos trabalhadores sobre turnos contínuos, excesso de horas
extra, condições de moradia superlotadas e sobre as causas do conflito. A
empresa disse que suas operações aderem aos códigos de conduta dos clientes,
aos padrões da indústria e das leis nacionais. “As condições da Foxconn podem
ser tudo, menos duras”, escreveu a empresa. A Foxconn também disse que nunca
foi multada ou advertida por um cliente ou governo por admitir menores ou por
expor seus trabalhadores a agentes tóxicos ou ao excesso de horas.
“Todos os funcionários da
linha de montagem têm intervalos regulares, inclusive de uma hora para o
almoço”, escreveu a empresa, e apenas 5% dos trabalhadores da linha de montagem
precisam ficar em pé para executar suas tarefas. As estações de trabalho foram
desenhadas segundo padrões ergonômicos e os funcionários têm oportunidades de
mudança no trabalho e promoção.
Código de conduta da Apple
Em 2005, alguns altos executivos
da Apple se reuniram dentro da sede em Cupertino, Califórnia, para uma reunião
especial. Outras empresas haviam criado códigos de conduta para policiar seus
fornecedores. A Apple então decidiu que era hora de fazer o mesmo. O código que
a Apple publicou naquele ano exige “que as condições de trabalho das
fornecedoras da Apple sejam seguras, que os funcionários sejam tratados com
respeito e dignidade e que os processos de manufatura sejam ambientalmente
responsáveis”.
Mas no ano seguinte, um
jornal britânico, “The Mail on Sunday”, visitou secretamente uma fábrica da
Foxconn em Shenzhen, China, onde os iPods eram fabricados, e fez um relato das
longas horas de trabalho, dos castigos físicos de flexões de braço e dos
dormitórios cheios. Os executivos em Cupertino ficaram chocados.
A Apple auditou a fábrica,
a primeira inspeção do tipo da empresa, e exigiu melhoras. Os executivos também
tomaram uma série de iniciativas que incluíram um relatório anual de auditoria,
primeiramente publicado em 2007. No ano passado, a Apple tinha inspecionado 396
instalações -incluindo fornecedores diretos da empresa, assim como muitos dos
fornecedores dos fornecedores- em um dos maiores programas do tipo dentro da
indústria de eletrônicos.
As inspeções encontraram
violações consistentes do código de conduta da Apple, de acordo com os resumos
publicados pela empresa. Em 2007, por exemplo, a Apple conduziu mais de três
dúzias de auditorias, dois terços delas indicaram que os funcionários
costumeiramente trabalhavam mais de 60 horas por semana. Além disso, havia seis
“violações centrais”, ou seja, das mais sérias, inclusive a contratação de
menores de 15 anos e falsificação dos registros.
Nos três anos que se
seguiram, a Apple conduziu 312 auditorias e todo ano encontrou evidências de
grandes números de funcionários trabalhando mais de seis dias por semana, assim
como horas extra excessivas. A Apple testemunhou 70 violações centrais no
período.
No ano passado, a empresa
conduziu 229 auditorias. Houve leves melhoras em algumas categorias e o índice
de violações centrais caiu. Contudo, em 93 fábricas, ao menos metade dos
funcionários trabalhava mais que o limite de 60 horas semanais. Um número
similar mostrou funcionários trabalhando mais de seis dias por semana.
“Se você vê o mesmo padrão
de problemas, ano após ano, isso significa que a empresa está ignorando a
questão, em vez de resolvê-la”, disse um ex-executivo da Apple com conhecimento
de primeira mão do grupo de responsabilidade dos fornecedores. “A não
obediência é tolerada, desde que os fornecedores prometam se esforçar mais da
próxima vez. Se fôssemos sérios, as violações centrais desapareceriam”.
A Apple diz que quando uma
auditoria revela uma violação, a empresa exige que os fornecedores resolvam o
problema em 90 dias e façam mudanças para impedir que o problema volte a
ocorrer. “Se um fornecedor não quiser mudar, extinguimos nosso relacionamento”,
diz a empresa em seu site.
A seriedade da ameaça,
contudo, não está clara. A Apple encontrou violações em centenas de fiscalizações,
mas menos de 15 fornecedores foram excluídos por transgressões desde 2007, de
acordo com ex-executivos da Apple.
A explosão
Na tarde da explosão da
fábrica de iPads, Lai Xiaodong ligou para sua namorada, como fazia todos os
dias. Eles esperavam se ver naquela noite, mas o gerente de Lai disse que ele
teria que trabalhar após seu horário, contou à namorada.
Ele tinha sido promovido
rapidamente na Foxconn e após poucos meses passou a ser responsável por uma
equipe que mantinha a máquina que polia o corpo dos iPads.
Na manhã da explosão, Lai
foi trabalhar de bicicleta. O iPad tinha começado a ser vendido semanas antes,
e os operários teriam que polir milhares de corpos de iPad por dia. A fábrica
estava frenética, contam os funcionários. As fileiras de máquinas cuspiam as
pequenas caixas de alumínio, enquanto os operários, com máscaras, apertavam
botões. Grandes dutos de ar por cima de cada estação de trabalho promoviam a
troca de ar, mas eles não conseguiam dar conta das linhas de máquinas polindo
sem parar. A poeira de alumínio estava em toda parte.
A poeira é um risco
conhecido. Em 2003, uma explosão de poeira de alumínio em Indiana destruiu uma
fábrica de rodas e matou um trabalhador. Em 2008, poeira agrícola dentro de uma
fábrica de açúcar na Geórgia causou uma explosão que matou 14 pessoas.
Duas horas depois do
início do segundo turno de Lai, o prédio começou a tremer, como se houvesse um
terremoto. Houve uma série de explosões, segundo contaram testemunhas. Quatro
morreram, 18 ficaram feridos.
No hospital, a namorada de
Lai disse que sua pele tinha se queimado quase completamente. Eventualmente,
seus familiares chegaram. Mais de 90% do corpo tinha sido tostado.
Depois da morte de Lai,
uma equipe de funcionários da Foxconn foi até a cidade natal e entregou uma
caixa de cinzas. A empresa depois enviou um cheque de cerca de US$ 150.000.
A Foxconn, em declaração,
disse que, na época da explosão da fábrica de Chengdu, cumpria todas as leis
relevantes e que, “após se assegurar que as famílias dos funcionários mortos
receberam o apoio necessário, garantiu que todos os feridos recebessem o
cuidado médico da mais alta qualidade”. Após a explosão, a empresa acrescentou,
a Foxconn imediatamente parou o trabalho em todas as oficinas de polimento,
melhorou a ventilação e eliminação da poeira e adotou técnicas para melhorar a
segurança do trabalhador.
A Apple, em seu mais
recente relatório de responsabilidade dos fornecedores, escreveu que após a
explosão, a empresa contatou “os principais especialistas em segurança” e reuniu
uma equipe para investigar e fazer recomendações para impedir acidentes no
futuro.
Contudo, em dezembro, sete
meses após a explosão que matou Lai, outra fábrica de iPads explodiu, desta vez
em Xangai. Novamente, a poeira de alumínio foi a causa, de acordo com
entrevistadores e o mais recente relatório de responsabilidade da Apple. Esta
explosão feriu 59 trabalhadores, 23 foram hospitalizados.
Em seu mais recente
relatório de responsabilidade dos fornecedores, a Apple escreveu que, enquanto
as duas explosões envolveram poeira de alumínio combustível, as causas das
explosões foram diferentes. A empresa recusou-se, porém, a dar detalhes. O
relatório acrescentou que a Apple tinha inspecionado todos os fornecedores com
oficinas de polimento de alumínio e tinha instalado maiores precauções.
Para a família de Lai,
ainda há perguntas sem resposta.
“Realmente não temos
certeza de por que ele morreu”, disse a mãe de Lai, diante do altar que
construiu perto de sua casa. “Não entendemos o que aconteceu”.
Tradutor: Deborah Weinberg
segunda-feira, 16 de janeiro de 2012
Funcionalismo ameaça Dilma com greve geral - Jornal Valor Econômico
Por Caio Junqueira | De Brasília
O funcionalismo público federal ameaça com uma greve geral o governo da presidente Dilma Rousseff. Após oito anos de proximidade com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, responsável pela concessão dos melhores acordos salariais desde a redemocratização, as categorias que representam os cerca de 1 milhão de servidores públicos estão insatisfeitas com o tratamento dispensado a elas pela sua sucessora. Em 2011 reivindicaram aumento de salários equivalente a R$ 40 bilhões, mas o governo concedeu apenas R$ 1,6 bilhão. Neste ano, Dilma já avisou que as negociações que vierem a acontecer não contemplarão novos reajustes.
Algumas razões sustentam essa sombria
perspectiva para o governo do PT, que teve o movimento sindical como um dos mais
consistentes pilares durante a sua formação. A principal delas é que o último
grande reajuste foi feito em 2007, o primeiro ano do segundo mandato de Lula.
Foram R$ 35,2 bilhões divididos em três parcelas anuais até 2010, com resíduos
em 2011.
Finalizadas essas parcelas, no ano
passado as categorias aguardavam novos reajustes. Segundo o Ministério do
Planejamento, da soma das reivindicações Dilma cedeu somente R$ 1,6 bilhão e
apenas para a área da educação. E mandou recados de que, se houvesse concessões
no futuro, não seria naquele montante pretendido. A justificativa oficial: a
necessidade de manter os compromissos fiscais associada às incertezas do cenário
econômico internacional.
A explicação pode ser insuficiente para
acalmar os sindicatos, que, neste ano, se animam com a possibilidade de
afrouxamento na política fiscal por conta das eleições municipais. O
funcionalismo pretende obter não só reajustes, mas também melhorias nas
condições de trabalho. São mencionadas a falta de estrutura tanto nas fronteiras
do país quanto nos novos campi abertos por Dilma e Lula, além da excessiva
terceirização e falta de segurança, por exemplo, para os fiscais do
trabalho.
O pedido mais vistoso, porém, é de
recomposição salarial decorrente de perdas causadas pela inflação acumulada
desde o acordo de 2007. O IPCA acumulado no período foi de 24,58 % o que, ao
menos por ora, ainda não sensibilizou Dilma. Na gestão Lula, a folha de salários
teve crescimento real de 36%, o que representou ganhos importantes para
praticamente todas as categorias dos servidores.
"As perspectivas não são boas e as
sinalizações de Dilma são piores. Vamos apostar nas negociações até esgotá-las e
se elas não avançarem, vamos radicalizar", disse Josemilton Costa,
secretário-geral da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal
(Condsef). Ligada à CUT, o órgão representa mais de 700 mil servidores, quase
70% de todos os funcionários do Executivo nacional. Não bastassem os possíveis
efeitos da crise internacional, ele aponta ainda outro fator que tem contribuído
para tensionar a relação com a presidente: "Dilma não é do movimento sindical
como Lula era. A relação com ela é distante e isso interfere nas
negociações."
Tal relato é frequente nos sindicatos
ligados ao funcionalismo público federal. Citações como "fomos enrolados",
"fomos ludibriados" e "fomos enganados" são recorrentes nas diversas carreiras.
O fato concreto que sustenta essa avaliação também é comum. No primeiro
semestre, houve promessas por parte do negociador oficial, o secretário de
Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Duvanier Paiva (veja entrevista
com ele nesta página), de que os servidores teriam ao menos parte das
reivindicações atendidas. Próximo ao prazo final, a mando do Palácio do
Planalto, as entidades foram informadas de que não seriam contempladas com
praticamente nada.
"O governo Lula conversava e o governo
Dilma também conversa. Só que, com Lula, a conversa tinha consequências. O
governo tinha intenção de negociar e dar aumento. Com Dilma não há nada efetivo
para oferecer. Há muita conversa e pouca ação", afirma Pedro Delarue, presidente
do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil
(Sindfisco). De acordo com ele, "neste ano as insatisfações vão estourar". "Nós
mesmo estamos nos preparando. Se as propostas resultarem em algo que não
reconheça as perdas podemos chegar a um movimento para demonstrar a nossa
insatisfação."
Não que uma eventual greve seja novidade
no governo Dilma. Em 2011, duas entidades, o Sindicato Nacional dos Servidores
Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (Sinasefe) e a Federação
dos Sindicatos dos Trabalhadores das Universidades Públicas Brasileiras
(Fasubra) pararam entre 1º de agosto e 26 de outubro.
Só que as outras duas principais
entidades educacionais, o Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de
Ensino Superior (Andes) e o Fórum de Professores das Instituições Federais de
Ensino Superior (Proifes), não aderiram e seguiram adiante nas conversas com o
governo. Foi a única classe que conseguiu tirar algo de Dilma no seu primeiro
ano de mandato: promessa de reestruturação da carreira de professor e 4% de
reajuste, abaixo, portanto, da inflação.
Esse processo mostrou outra
característica da relação com o funcionalismo sob o comando de Dilma, segundo os
sindicalistas: a aposta na fragmentação dos interlocutores justamente para
fragilizá-los. "O governo estabeleceu com quem queria negociar. Decidimos parar
a greve quando vimos que estávamos isolados. Quando você negocia com parte do
movimento você enfraquece todo o movimento", afirma William Carvalho,
coordenador do Sinasefe.
Ele avalia, porém, que essa estratégia
será prejudicada em 2012, tendo em vista que os servidores sentirão ainda mais
as perdas com a inflação e já estarão mais preparados para negociar com Dilma,
por conta da experiência de 2011. "O governo tem que se organizar porque vai ter
que controlar a economia e o ânimo dos trabalhadores. Terá que quebrar nossa
unidade de novo, só que com menos dinheiro ainda para gastar. E quem teve acordo
abaixo da inflação vai perceber isso."
Essa unidade começou a ser buscada nesta
semana, na primeira reunião do fórum que reúne 32 entidades sindicais do
funcionalismo federal. Ali foram ventiladas possibilidades de atuação, mas não
houve uma definição clara sobre a estratégia a ser adotada neste ano. Se por um
lado percebe-se facilmente uma insatisfação geral com Dilma, por outro há
divergências quanto ao melhor caminho a seguir.
Isso se deve ao fato de a maioria das
organizações sindicais do funcionalismo público, assim como no setor privado,
estar vinculada a partidos políticos. Nesse sentido, sindicatos mais favoráveis
à greve tendem a ser mais ligados a partidos de oposição à Dilma. Em especial os
situados à extrema-esquerda com pouca ou nenhuma representação no Congresso
Nacional, como PSTU e PSOL. Consideram, portanto, uma paralisação como o espaço
ideal para impor seu discurso. Em outra frente, estão as entidades mais
moderadas, muitas delas oriundas do petismo.
Esse quadro ficou nítido com o que
ocorreu no setor da educação em 2011. As entidades que fizeram greve, Fasubra e
Sindsefe, são mais oposicionistas, embora a primeira seja mais dividida. A que
liderou as negociações com o governo Dilma, o Proifes, foi criado em 2004, de
dentro do governo Lula. Desde então, desidratou a Andes, que sempre liderou o
setor e também é mais ligada à oposição. Só que em 2011, caminharam juntas pela
primeira vez.
Dirigente do Proifes, o professor de
matemática da Ufscar, Gil Vicente, nega haver governismo na entidade. "Não se
pode colocar um debate sindical a reboque de forças partidárias e na nossa
avaliação era isso que ocorria. Entidades sempre querendo reajustes inviáveis
para gerar conflito. Era greve todo ano e o salário caindo", disse. Vicente
classifica a atuação do Proifes como "mais que pragmática, embora independente".
Declara ainda haver muitas entidades que "estão aí para fazer a revolução do
proletariado e derrubar o capitalismo".
E, ao contrário da maioria dos
sindicalistas com os quais o Valor conversou, diz que a
situação econômica externa tem tido muito mais influência no curso das conversas
com o governo do que a passagem da era Lula para Dilma. Segundo ele, "a greve
não está descartada, mas também não está no horizonte". Um alento para a
presidente da República.
'Não haverá concessão por ser
ano eleitoral'
Por De
Brasília
No cargo desde junho de 2007, o secretário de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Duvanier Paiva, foi o responsável por negociar os acordos que promoveram os maiores reajustes para o funcionalismo público federal desde a redemocratização. Todos eles assinados no segundo mandato do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Sem a intimidade com o movimento sindical que o seu antecessor tinha, a presidente Dilma Rousseff optou por manter em seu governo o mesmo negociador. Entretanto, se na era Lula Paiva teve o papel de distribuir aos funcionários públicos as benesses do crescimento econômicos, no primeiro ano de governo Dilma seu papel foi o de segurar as categorias após lhes passar as informações sobre os poucos, quase nulos, reajustes de 2011.
"Foi um ano difícil. Todo primeiro ano tem naturalmente uma posição cautelosa em relação a orçamento e gasto, principalmente com pessoal. E também houve a crise internacional", disse em entrevista ao Valor.
Sua avaliação é de que em 2012 esse relacionamento tende a ser mais conflituoso, não só pelas incertezas da crise, mas também por ser ano eleitoral. Segundo ele, além de o tempo para negociações diminuir, a disputa política "se dissemina por todos os espaços". Ele, porém, alerta: "O governo não faz concessão por ser ano eleitoral". Nascido em São Paulo, ele construiu boa parte de sua carreira no meio sindical. Foi assessor político da CUT, secretário de Formação da CUT-SP e idealizador e coordenador da Escola Sindical de São Paulo. Veja a seguir trechos da entrevista ao Valor:
Valor: Há muita reclamação do funcionalismo sobre a relação com Dilma. Por que?
Duvanier Paiva: Sempre houve greve e mobilização. O sindicato é para isso mesmo. Reclama, vem para cima. Está cumprindo o papel dele. Em 2011 tivemos um resultado político importante. Fizemos a mesa permanente de negociação, o que significa um exercício permanente do diálogo. Então todo esse processo de conversação e de diálogo permitiu que chegássemos a um momento em que os sindicatos compreenderam a crise. Fizemos poucos acordos, atendemos demandas represadas, com impacto orçamentário pequeno. Em 2012 haverá pouco impacto de pessoal.
Valor: Como avalia a relação de Dilma com o funcionalismo?
Paiva: Foi um ano difícil. Todo primeiro ano exige uma posição cautelosa em relação a Orçamento e gastos, principalmente com pessoal, um gasto polêmico que a sociedade discute muito. Então houve cautela. Além disso, foi um ano de crise internacional. Então o relacionamento com o funcionalismo ficou difícil. Mas mesmo assim mantivemos o diálogo, mostramos que os reajustes não viriam, até porque os que foram dados no último período Lula foram importantes.
Valor: Essa relação com Lula ajudou a segurar as greves?
Paiva: Em 2007 e 2008 fizemos acordos de médio prazo a serem pagos em três parcelas em 2008, 2009 e 2010. Algumas classes tiveram resíduos em 2011. O governo Lula não deu nada, negociou. Foram conquistas dos sindicatos, resultado da mesa de negociação. Fizemos 48 acordos que resultaram na reorganização de várias carreiras e de toda a estrutura remuneratória do funcionalismo federal, com resultados expressivos para várias carreiras da União.
Valor: Há uma mudança na relação do governo Dilma com Lula?
Paiva: Não há. A comparação é óbvia e natural, mas a presidenta tem demonstrado que é um governo de continuidade em relação aos compromissos assumidos pelo anterior, com a valorização do trabalhador e dos segmentos mais vulneráveis da sociedade. As prioridades mostram que há continuidade de governo. O fato de não ser sindicalista não significa que ela não tenha uma visão da importância da classe trabalhadora. Algum sindicalista pode achar que não, que a relação com Lula era diferenciada, mas no resultado não há diferença. Exemplo disso é a política de salário mínimo. Na nossa opinião, não há qualquer prejuízo do ponto de vista histórico e político. Ela tem compreensão das classes sindicais.
Valor: Mas praticamente todos estão falando em greve.
Paiva: É natural. Em 2011 teve esse problema da crise e era também o primeiro ano de governo. Houve poucos reajustes. Então neste ano vai ter uma pressão grande. A mesma que encontramos em 2003, quando assumimos. Havia uma defasagem [salarial] grande, que foi recuperada. Os sindicatos acham que precisam conquistar o máximo agora porque em 2011 fizemos só o necessário, ou seja, porque só atendemos à demanda represada dos anos anteriores. Então é natural que estejam se preparando para vir para cima da gente com toda a força. Mas também estamos preparados. Nossa preparação é o diálogo. Eles sabem que o que vai resolver é a conversa na mesa de negociação.
Valor: Deve ser o ano mais difícil dos governos do PT?
Paiva: Tem uma dificuldade que é o fato de ser ano eleitoral. O calendário encurta.
Valor: Qual o efeito de uma eleição nessa negociação?
Paiva: Em ano não eleitoral temos até agosto para conversar, que é o prazo para o Orçamento ser enviado. No ano eleitoral, temos que resolver, no máximo, em julho, fim de junho. Temos menos tempo. E é um ano de disputa política. Há um grau de mobilização maior.
Valor: O governo tende a ceder mais?
Paiva: O governo não faz concessão por ser ano eleitoral. O espaço de tempo para negociar é menor, todos os interesses e projetos políticos estão ligados, há intensa mobilização e debate, tudo está em jogo e a disputa política acaba se repetindo e se disseminando por todos os espaços. Mas os próprios sindicalistas sabem que o governo não vai ficar mais frágil ou ceder mais porque é um ano eleitoral. Isso é um fetiche. O que há é a eleição funcionando como um intensificador do debate, o que significa que o resultado da negociação vai ser de qualidade.
Valor: Ainda sobre as reclamações, parece que os governadores enfrentaram muito mais problemas com seus servidores do que a União. Concorda?
Paiva: A diferença é a negociação. Relação de trabalho é conflituosa. Mas todos acham que na administração pública não há conflitos porque o servidor adere a um estatuto e não a um contrato de trabalho. Isso criou um senso comum de que essa relação de trabalho não é conflituosa. Isso é falso. Há conflitos. Por isso o governo desenvolveu a negociação. Existe uma mesa permanente que trata de todas as relações com o servidor federal. A diferença é essa. Existe um processo de tratamento desses conflitos.
Valor: O que mudou do governo Lula para o de Dilma?
Paiva: Como sou secretário desde o governo Lula, meu olhar é de continuidade. E tem um dado importante. Sou secretário de Recursos Humanos e a partir de fevereiro vou ser secretário de Relações do Trabalho. Será uma secretaria voltada especialmente para tratar das relações com o servidor. Significa valorizar a negociação, ter uma estrutura própria para isso. A presidenta, então, consolida um processo de negociação. Vamos ter uma estrutura em tempo integral para tratar exclusivamente do relacionamento com o servidor. (CJ)
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